domingo, fevereiro 11, 2007

Amor, essa idiossincrassia pequeno-burguesa

Nina não era uma garota fácil. Nina não prestava atenção nas bobagens que eu dizia após a primeira dezena de chopes. Nina sorria decerto, mas um sorriso seu que não me dava maiores liberdades.

Nina, sobretudo, me fazia calar. Sem esforço, bastava apenas um gesto ou uma mudança repentina no ritmo da respiração e eu me calava. Não sei se algum livro de filosofia ou auto-ajuda está escrito que o amor passa pelo respeito ao silêncio do próximo, mas eu tenho plena fé de que os amantes conseguem calar na hora certa.

E em meu silêncio, eu descobria melhor Nina. Observava mais e melhor, ouvia sem ruídos. E ia me deixando levar em cada nuance, como na vez em que reparei que ela tinha uma pronúncia diferente nas consoantes fricativas. Não sei explicar, mas era diferente e era algo que eu não escutava em nenhum outro lugar. Em cada, faca, fêmur ou farofa eu tinha síncopes e escalava os maiores everestes.

O problema, e era um senhor deles, era Nina gostar de mim. Digo que gostava, mas não era esse gostar de me comer com os olhos quando fazia enamorada após a terceira taça de vinho, quando eu arrumava a tevê, quando eu dei um jeito no chuveiro que pingava, quando chegava nervoso em casa. Isso foi depois.

Diz ela que foi depois de um dia que me viu assediando acintosamente uma prima dela, a Marta. Ela reparou o tom da voz, o olhar carnívoro, a fumaça do cigarro expelida com vontade. E teve ciúmes de que Marta estava vendo um homem em ação e era mais nova que ela, dois meses e cinco dias mais moça.

Uma hora, Marta, confiante, foi ao banheiro e nos deixou em par na mesa. Quando voltou, só achou o dinheiro da conta. No carro, a caminho do quarto dela, Nina já me comia com os olhos.

Um comentário:

nina disse...

Cadê? Não tem mais?